Faz-me sempre confusão certa escrita facebookiana, assim
como comentários gratuitos e amizades meramente virtuais. Faz-me uma certa
espécie que se adicionem pessoas só porque sim, só porque estão no Facebook do
amigo do amigo, da amiga, do amigo. Faz-me espécie esta nova realidade virtual
em que muitos vivem quase exclusivamente. Talvez esteja a ficar velha para este
novo mundo mas creio que há valores que não cessam com a modernidade e há
princípios que não se apagam com tecnologia. Fazem-me ainda mais espécie os
recados de mural, as criticas gratuitas e as pseudo independências do “eu não
quero saber e nem me deixo afectar mas estou aqui a falar disto na mesma”. As
redes sociais estão cheias de corajosos, repletas de valentões que não levam
desaforos para casa, de gente sem papas na língua, de eruditos e bem formados
que não admitem nada, de nada – mesmo quando nem percebem muito bem do que
falam ou porque falam. Estão cheias de sindicalistas e revolucionários, desde
que devidamente escudados pelo seu gadget. Atrás do nosso teclado somos todos
homens e mulheres de grande indignação politica e social, temos uma opinião
sobre tudo e sobre todos e não há assunto que nos escape ou nos deixe sem
resposta. Somos uns verdadeiros pensadores do mundo virtual ainda que, grande
parte das vezes, não façamos a mínima ideia do que se passa além do nosso
umbigo. Somos todos altruístas, desinteressados, preocupados com o que acontece
aos cãezinhos, aos pobrezinhos, às criancinhas, com a fome no mundo e a pobreza
do país. Somos todos mais e melhores que o vizinho mas sem malícia e sempre mas
sempre, desinteressadamente. Postamos a vida toda na página mas só porque
queremos partilhar e não porque queremos esfregar os nossos feitos na cara dos pseudo
amigos virtuais, comentamos sobre tudo e gostamos das fotos deste mundo e do
outro, excepto se alguém publicar um verdadeiro feito pessoal ou profissional,
pois não podemos ser relembrados de que alguém pode ter, ser ou alcançar mais
do que nós. Mas continuamos a ser todos muito altruístas e tudo o que fazemos é
pelos outros, é pelo bem comum. Ficamos tão indignados com a sugestão de que
mais pessoas deviam emigrar se isso for bom para elas, revolta-nos a situação
financeira do país mas não combatemos isso com mais trabalho, ao invés fazemos
greves porque é isso que nos tira do buraco. Ah! Mas as greves são para
defenderem os direitos individuais! Bem, continuamos a ser muito altruístas e
só queremos o bem de todos. Gostamos muito do nosso Portugal mas se a Selecção
anda mal são todos uns filhos da outra senhora. Vamos de férias para o
estrangeiro (eu incluída), mandamos os filhos em Erasmo e está sempre tudo uma
real porcaria. Mas na boca temos sempre orgulho em ser portugueses, temos
sempre orgulho nos amigos que temos sempre em quantidade, somos sempre boas
pessoas ainda que nunca olhemos para a senhora que nos limpa o escritório ou
para o porteiro que todos os dias nos abre a porta do prédio. Acima de tudo
somos pessoas resolvidas e esclarecidas, nunca guardamos rancores porque os escarrapachamos
online e nunca fazemos juízos de valor porque preferimos fazer criticas vãs e
sem nome para quem quiser apanhar. Somos, sem dúvida, um grande país mas ainda
estamos a percorrer o longo caminho para sermos boas pessoas. Precisamos
perdoar mais, viver mais, ouvir antes de falar, sentir antes de julgar (ou não
julgar de todo), dar antes de cobrar, sermos o nosso melhor, todos os dias e em
todas as coisas, exigir mais de nós, sermos coerentes na nossa exigência, não
esperar mais dos outros do que aquilo que damos de nós mesmos, não dar menos
aos outros do que gostaríamos de receber. Amar mais, respirar fundo, pensar
menos sobre coisas que não nos interessam ou não acrescentam nada à nossa
felicidade, falar menos dos outros e concentrarmos a nossa energia naquilo que
somos ou podemos ser. Querermos e tentarmos ser melhores, sempre. Todas as
pessoas podem aprender e todas as pessoas têm algo a ensinar, independentemente
da sua idade, status ou profissão. Basta estarmos com atenção àquilo que
efectivamente importa.